quinta-feira, 18 de março de 2010

Detectar e tratar adequadamente depressão reduz taxa de

Como vimos até aqui, pessoas acometidas por depressão têm
maior risco de suicídio. O risco é maior na vigência da doença e
de comorbidades. O risco é menor quando a doença é tratada ou
está em remissão. Assim, a detecção e o tratamento adequado
de pessoas acometidas por transtornos mentais, notadamente
depressão, a partir do atendimento em serviços gerais de saúde
parece ser a forma mais efetiva de prevenir o suicídio. Esta
estratégia foi encampada, no Brasil, pelo Ministério da Saúde e
consta da Estratégia Nacional de Prevenção do Suicídio.
Um estudo realizado em Gotland, uma ilha da Suécia, é um bom
exemplo de como uma intervenção que incluiu capacitação de
profissionais, visando à maior detecção e ao tratamento adequado
da depressão, pode reduzir o número de suicídios. Dois anos
após o início do projeto, houve redução de 60% no coeficiente
de mortalidade por suicídio. Tal redução deu-se principalmente
entre os que tiveram diagnóstico de depressão e que estavam em
acompanhamento médico, um grupo formado majoritariamente
por mulheres e idosos. Não houve diminuição dos coeficientes de
suicídio entre homens. De modo geral, estudos baseados em capacitação de médicos, com foco em detecção e tratamento da
depressão, evidenciam aumento de prescrição de antidepressivos
e declínio nas taxas de ideação e de suicídio.
Ao longo de dez anos, a associação de um programa educacional
sobre depressão e um programa com base na comunidade para
detecção de depressão em idosos em Yasuzuka (Japão) obteve
resultados semelhantes aos do estudo de Gotland. O risco de suicídio entre as mulheres idosas diminuiu 64%; contudo, entre os homens não houve diferença significativa. Entretanto, algumas pesquisas não confirmaram os bons resultados obtidos em Gotland e Yasuzuka, quando o programa educacional dirigiu-se especialmente a médicos da atenção primária.
Atualmente, para tornar o manejo da depressão clinicamente efetivo,evidências sugerem abordagens complexas e multifacetadas. A Aliança de Nuremberg contra Depressão realizou um programa de intervenção com duração de dois anos em Nuremberg (Alemanha), em quatro níveis: treinamento de médicos de família e suporte através de diferentes métodos; uma campanha pública informativa sobre depressão; parceria com facilitadores da comunidade (professores, padres, mídia local etc.); e suporte para atividades de auto-ajuda, assim como para grupos de
alto risco para o suicídio. Os efeitos dessa intervenção no número deatos suicidas (suicídios mais tentativas de suicídio, definidos como principal resultado) foram avaliados comparando-se aos dados obtidos após um ano e com a região controle (Wuerzburg). Mesmo levando-se em consideração as limitações do estudo, a Aliança de Nuremberg contra a Depressão presumivelmente melhorou o cuidado dos pacientes deprimidos e preveniu o comportamento suicida. Foi detectada uma redução na freqüência de atos suicidas, em Nuremberg, de 19% e 24%
durante o primeiro e o segundo ano do programa, respectivamente. O projeto de Nuremberg foi expandido para outras regiões da Alemanha e, em virtude dos seus resultados positivos, 18 parceiros internacionais, representando 16 países Europeus, formaram a Aliança Européia contra a Depressão em 2004.
Ações de prevenção do suicídio também podem ser iniciadas
no hospital geral, em pelo menos dois grupos de indivíduos: nos
que, avaliados ambulatorialmente ou internados, detecta-se um
transtorno mental; e entre os que são atendidos devido a uma
tentativa de suicídio.
Estima-se que o risco de suicídio em pacientes internados em hospital geral seja três vezes maior do que o da população geral. A maioria dos que cometem suicídio durante a internação sofre de doenças crônicas ou terminais, ou ainda de condições que são dolorosas e debilitantes.
Da mesma forma que na população geral, o suicídio é mais freqüente entre os que têm comorbidade psiquiátrica, comumente não detectadas pela equipe assistencial. Um estudo de autópsia psicológica mostrou que 88% dos pacientes que se suicidaram durante uma internação sofriam de um ou mais transtornos psiquiátricos.
Em um estudo realizado no Hospital das Clínicas da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp), numa amostra aleatória de 253
internações, estimou-se um risco elevado de suicídio, segundo o The Mini International Neuropsychiatric Interview (MINI) em 5% dos
pacientes. Esses últimos tinham diagnóstico recente de uma doença grave, feito durante a internação, agudizações de doenças crônicas e sofrimento crônico por câncer ou deformidade física. O risco foi maior em adultos jovens, menores de 30 anos de idade, entre os que não tinham vínculo matrimonial e dentre os que se encontravam deprimidos.
Entre os 74 pacientes sofrendo de depressão maior, 58% tinham risco de suicídio, contra 0% entre os não afetados por depressão. Namesma linha desses resultados, um estudo dinamarquês que avaliou 5.000 pacientes com esclerose múltipla demonstrou maior risco entreadultos jovens.
O risco entre o que tinham sido diagnosticados após os 40 anos de idade foi próximo ao da população geral. Outros estudos
evidenciaram maior risco de suicídio em adultos jovens entre pacientes
com lesão medular, Parkinson e acidente vascular cerebral.
Considerando-se essas informações, é recomendável uma ação proativa de serviços de interconsulta psiquiátrica e de psicologia hospitalar, capacitando profissionais a detectar e a tratar casos de depressão, de uso patológico de álcool e de risco de suicídio durante a internação e após a alta hospitalar.
Há vários ensaios clínicos que se valeram de intervenções
psicossociais visando evitar novas tentativas de suicídio, disponíveis em artigos de revisão. Quando se usa como desfecho detratamento a repetição de tentativas de suicídio, o conjunto de
publicações traz resultados controversos. Por outro lado, alguns
estudos evidenciaram que contatos regulares com grupos de alto
risco de suicídio resultaram em decréscimo significativo no número
de suicídios após período variável de seguimento.
Um ensaio clínico com 1.867 casos de tentativas de suicídio em cinco centros participantes do SUPRE-MISS (Campinas, Brasil;
Chennai, Índia; Colombo, Sri Lanka; Karaj, Irã; e Yuncheng, China)
comparou uma intervenção psicossocial de baixo custo (entrevista
motivacional, mais contatos telefônicos regulares) com o tratamento
usual disponível nesses locais (geralmente, alta hospitalar, com ou sem encaminhamento ambulatorial). Ao final de 18 meses, menos mortes por suicídio ocorreram no grupo que recebeu a intervenção do que no grupo que recebeu tratamento usual (0,2% vs. 2,2%, respectivamente,p < 0,001). Estes resultados mostram que tal programa poderia ser uma alternativa interessante para a prevenção de suicídio em países que dispõem de poucos recursos financeiros aplicados na área da saúde.

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